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Adolescência e a escolha da orientação sexual

A escolha da orientação sexual dos adolescentes e jovens, vem, cada vez mais, sendo alvo de intolerância e violência por parte dos elementos que compõem a sociedade. A mídia, dia após dia, vem notificando altos índices de homicídios praticados contra a população LGBTQIA+ e de forma assustadora, presenciamos a expressão do ódio nas redes sociais e por todos os lugares, através de postagens recheadas de conteúdos homofóbico.

Por outro lado, vemos adolescentes, descobrindo sua sexualidade e sem saber lidar com o preconceito de uma sociedade estruturalmente heterossexista e machista, onde pessoas que não se encaixem no “imaginário social”, sofrem as consequências pela “escolha errada”. Paralelo à esse quadro, existem ainda, os conflitos naturais da adolescência, decorrentes das mudanças inerentes à idade e a construção de sua subjetividade. 

Dentro dessa realidade, esse artigo aborda sobre a importância do acolhimento à esses adolescentes e jovens sob três óticas: família, escola e sociedade.

De onde vem o preconceito?

 

Na cultura grega, relações homoafetivas masculinas eram aceitas e acreditava-se que, numa relação homossexual, podia ocorrer a troca de características como força e bravura, sendo inclusive, incentivadas relações entre soldados.

Com a chegada do Cristianismo, na Idade Média, a prática homossexual passou a ser considerada um pecado abominável e era permitida apenas com objetivo de procriar. A população, obediente aos princípios religiosos, começou a praticar violência contra pessoas que infringissem as leis divinas e “desagradassem a Deus”.

Durante os séculos XII e XIX, alguns países puniam com pena de morte aqueles que fugissem do padrão heteronormativo. Era comum punir com a queima do corpo até que não mais houvesse vestígios da existência do pecador.

Apenas no final do século XIX, com a influência da Revolução Francesa, iniciou-se a descriminalização das práticas sexuais, iniciada pela França e depois pelo Brasil. Mas antes de ganhar voz e movimentos mais atuantes em sua defesa, os homossexuais chegaram a ser considerados pela ala conservadora da psiquiatria e outros segmentos da sociedade, como doentes mentais e, sendo assim, com necessidade de tratamento médico que fosse capaz de “curar” o doente.

Como a intolerância sexual interfere na construção da subjetividade do adolescente

 

Muitos jovens se sentem inseguros e com medo de assumir sua sexualidade quando se percebem fora da heteronormatividade. Inicialmente, há a questão subjetiva da não autoaceitação ao se perceber diferente de seus colegas. Quando um menino(a) se sente atraído por outro(a) e tem a percepção de que aquele comportamento não é o esperado pelo senso comum, inicia um sofrimento interno que pode culminar no adoecimento emocional do indivíduo.

A sociedade contemporânea ainda rejeita a homossexualidade e essa rejeição, desperta nos jovens uma homofobia internalizada, uma dificuldade de aceitação da sua própria condição sexual

Se a adolescência por si só, já é uma fase que carrega muitos conflitos, os jovens homossexuais estão mergulhados em questões ainda mais complexas, porque nessa fase, o adolescente precisa despertar em si a sensação de pertencimento. Para que haja a criação de sua identidade de forma saudável, o indivíduo precisa se sentir parte da família, da escola, da sociedade e, quando percebe-se fora do padrão heterossexual esperado, tem a tendência a se encolher, esconder, omitir-se para evitar sofrer discriminação, violência, preconceito.

Como podem se sentir seguros para assumir sua sexualidade se assistem a toda hora notícias sobre todo tipo de ódio que a sociedade despeja nessa parcela da população?

O importante papel da família na construção da identidade do adolescente homossexual

 

A família é a base de tudo. É a partir da família que o indivíduo se prepara e adquire ferramentas emocionais para enfrentar o mundo. Não importa que tipo de formação tenha a família, mas um grupo de pessoas, unidas por laços afetivos que se apoiam, se cuidam, trocam conhecimentos e partilham momentos bons e ruins.

Quando um adolescente se declara homossexual para a família e não recebe apoio, mas ao invés disso, se sente julgado e discriminado, ele poderá se isolar cada vez mais do mundo, culpando-se por sua orientação sexual e correndo risco de adoecer emocionalmente, devido ao grande sofrimento que sentirá.

Alguns estudos apontam que a violência homofóbica começa nas relações familiares. Muitos pais, cometem atrocidades com os filhos, quando descobrem que são homossexuais, e adolescentes relatam que o que mais os impedem de assumir sua sexualidade é o medo da reação dos pais.

Se família é um lugar de aconchego, partilha e aprendizado, se é nela que adquirimos ferramentas para enfrentar o mundo, deveria ser ela, a primeira a acolher esse indivíduo já fragilizado e assustado que procura uma validação para sua descoberta e um colo afetivo.

Por que não reconhecer e aceitar esse adolescente na sua individualidade? Até quando nos deixaremos levar por um preconceito que enquadra o ser humano em caixinhas cheias de regras, ditadas por uma parte dominante da sociedade que exclui tudo que não for do seu interesse e a faz perder o controle?

Pessoas amam pessoas, é disso que precisamos falar, é isso que precisamos entender, não importa as características e escolhas de cada um, porque se tirarmos todas elas, vai ficar apenas a essência humana e essa essência não tem sexo, nem cor, nem partido, nem religião.

É dentro de casa que ensinamos esses valores reais e verdadeiros, nosso exemplo de um olhar humanizado para o outro começa no nosso lar, acolhendo as diferenças de cada um, respeitando a individualidade, acolhendo os que estão em sofrimento tão perto de nós, muitas vezes sufocando um pedido de socorro por medo dos olhares julgadores. Os adolescentes precisam sentir que pertencem e são aceitos do jeito que são.

E a escola? Como ela pode influenciar na formação da subjetividade do adolescente?

 

É na escola que crianças e adolescentes passam grande parte do seu dia e cabe à escola, a formação de cidadãos, bem como, sua socialização. Porém, o ambiente escolar não está isento das cenas de homofobia e discriminação. Meninos e meninas quando apresentam comportamento diverso do esperado referente ao sexo biológico, são apelidados, agredidos, sofrem bullying e esse contexto, interfere tanto no seu desenvolvimento escolar, como social e emocional.

Uma das causas da evasão escolar, é a homofobia, adolescentes fugindo para outros lugares, para escaparem de sofrer violência dentro dos muros da escola.

Uma vez que a escola é um ambiente plural, é nesse espaço que deveriam ocorrer debates sobre a homossexualidade e formas de acolhimento aos adolescentes, mas há um despreparo dos próprios professores, coordenadores e gestores, que muitas vezes não sabem como conduzir um conflito dessa natureza. Muitos preferem silenciar ou deixar que passe despercebido o desconforto de um aluno, ao invés de aproveitar o momento e abrir rodas de conversas e interações onde esse sujeito se sinta acolhido pelo sistema.

Crianças e jovens deveriam aprender na escola, ferramentas que lhe ajudassem a enfrentar seus conflitos internos e externos. Hoje vemos essa geração apresentar tão cedo, sintomas de ansiedade, depressão e outros transtornos emocionais porque não se sentem encaixados nos padrões sociais. Os índices de autolesão e tentativas de suicídio e suicídio na faixa etária entre 15 e 29 anos assustam cada vez mais, resultados de indivíduos adoecidos por não atenderem às expectativas de uma sociedade também adoecida.

É preciso que a escola tenha um olhar individualizado, acolha cada um dentro de seu contexto, de sua história, de suas limitações, de suas escolhas e ensinem todos a respeitarem cada um. Quando ensinamos os verdadeiros valores desde cedo, a criança vai entender que o outro é diferente dela e tudo bem por isso, e é disso que a humanidade precisa, se sentir humano acima de tudo.

 Sociedade: ainda muito a avançar em relação à homossexualidade


Embora tenham ocorrido avanços importantes na luta pela causa LGBTQIA+, ainda estamos longe de uma sociedade humanitária e igualitária. A resistência vem gritando cada vez mais alto que ser homossexual ou qualquer outro gênero, não faz o indivíduo diferente dos demais e tem levado muitos jovens a assumirem sua identidade, mesmo correndo risco de não ser aceito.

Adolescentes e jovens estão cansados de terem que esconder sua verdade por medo de serem estigmatizados. Vestir máscaras de heteronormativos não mais atrai os jovens. Eles querem serem vistos, respeitados, aceitos.

Quando um sujeito cria uma identidade, ele não está criando apenas para si, porque ela não assume apenas caráter pessoal, mas também social e político, por isso, quando se define homossexual, ele passa a pertencer a um grupo que, até então, sofre sanções por fugir dos padrões heterossexistas e heteronormativos. Com isso, muitos assumem o risco de se tornarem vítimas da violência direcionada à essa parcela da população.

Dessa forma, o sujeito se encontra num dilema entre, correr riscos ou se empurrar para o isolamento, embutindo aquilo que pulsa dentro de si? É um processo de escolhas que se inicia dentro de casa, com a família.

A partir do momento que ele é aceito ou não pela família e posteriormente na escola (não necessariamente nessa ordem), é que o sujeito vai ter ou não, condições de assumir sua escolha para o resto da sociedade. Estudos indicam que  a reação que essas pessoas têm sobre a revelação é essencial para ajudar esses adolescentes a traçar seus futuros afetivo-sexuais e construir suas identidades de gênero de uma forma mais confortável para si mesmos e sem medo de não serem aceitos.

Por isso o importante papel da sociedade, acolher esse sujeito que já vem em busca de seu espaço, do respeito à sua individualidade e escolhas há muito tempo, desde a descoberta feita por ele numa fase de conflitos, até o momento de se permitir ser quem é, na certeza de que ele não está ofendendo ninguém, está apenas fazendo escolhas, assim como escolho vestir amarelo, mesmo sabendo que o outro prefere vermelho e, está tudo bem por isso.

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